domingo, 19 de junho de 2022

Discípulos Do Amor

    



Tenho uma certa questão com a narrativa do sozinho. O conceito mesmo. Como, por exemplo, a distinção entre solidão e sozinho. Solidão é algo que todo mundo já sentiu, já viu, já passou. É a mesma coisa do estar desolado, num grande e vasto zero, completamente distinto do um. Já o sozinho, apesar de num primeiro momento ser nada além de um predicado, é na verdade pura e severa tristeza. É desafeto, pesar. Engraçado né? Solidão é não estar acompanhado, tipo ir na padaria; mas estar sozinho é não ter ninguém pra te acompanhar, tipo não ter como convidar alguém praquele compromisso insuportável, mas inevitável.

    E justamente na inevitabilidade de se sentir muito mal ao constatar não a solidão, mas o estar sozinho, em nossas próprias vidas, que vem o desespero e o ímpeto de mudar. Assim como nos foi ensinado que estar sozinho é muito ruim e horrível, nos foi ensinado que pra acabar com a solidão a gente tem que avaliar opções, mandar umas DMs, voltar pro Tinder, aprender que é completamente proibido perguntar pras pessoas como elas estão, pois assertividade e criatividade em uma única frase são tudo que alguém precisa saber sobre você. Você tem que valer a pena uma resposta. E as pessoas tem que valer a pena as suas perguntas. 

Consegue ver a lógica por trás disso?

    Obviamente, ao lidar com o aspecto social da vida como se fosse somente mais um produto na prateleira do mercado, nossas próprias emoções e relações deixam de ser uma questão de saúde e bem-estar e se tornam uma questão de produtividade, gerenciamento de tempo, resultados, comportamentos... e não chega a ser uma surpresa quando vários de nós passamos a protelar uma conversa com o RH dos nossos próprios divertidamentes por estarmos sofrendo de um burnout cujo a causa é o medo do estigma do estar sozinho. Muita gente tem essa dependência pelo relacionamento, companhia, sexo,

Essas paradas aí

e eu também achei que tinha, afinal sou um discípulo da Mulher Melancia -- tem solteira aqui hoje? risos -- Então aproveitei um fora que tomei em abril e (ler daqui pra frente como se eu fosse um paulista com mais de 15mil seguidores no instagram) decidi me reencontrar com o meu eu, sair mais com os amigos, novos hobbies, #DatesComigoMesma ,  a porra toda, porque sei lá, todas as blogueiras falam disso, as tirinhas de amor e tals... Até Kierkegaard já dizia que um dos pré-requisitos pra se religar ao Todo é o paradoxo do amor, aprender a se amar para então conseguir amar plenamente o outro. Mas como tudo na minha vida, o gosto foi de frustração, pois fiquei sozinho é foi o máximo, cara!!! E eu sou muito bom nisso também. Tenho hobbies que nunca pensei ter, amigos novos, rituais de solidão muito bem apreciados e reencontros ainda mais divertidos, mesmo na monotonia do cotidiano. E cheguei num ponto que beirou a arrogância, sabe?? "Como assim as pessoas não sabem ser sozinhas?? Vocês por acaso são idiotas???"


    Meu problema sempre foi estar com os outros, na verdade. Acho que é comum de quem não é a coisa mais sociável do mundo lidar constantemente com a frustração do desencontro pós-se-encontrar. Mas a ficha só caiu recentemente. Partir pra próxima com leveza, independentemente da conversa ter sido legal ou não é um talento que nem todo mundo tem, mas qualquer um pode conseguir. E entender que não se deve nada a ninguém é libertador, tanto para os sozinhos quanto para os acompanhados. Um professor meu meio que disse uma vez, "ao comer uma banana, nós não comemos a banana em si, mas os significados embutidos nela". E, mesmo estando errado o que eu disse aí, faz sentido no que vou falar em seguida: a questão não é estar sozinho, mas sim os significados atrelados à estar sozinho. Quanto mais a gente se desprender dessa nojeira imposta e nos atermos ao que realmente temos em vista, mais satisfeitos estaremos com o que temos aqui. Mais felizes estaremos, e estar sozinho não será mais uma questão.


FALOU!!