sábado, 23 de dezembro de 2017
Restauração
Eu tomei um baque.
E o pior é que esse baque tem me atingido ao longo do ano inteiro. Eu sei porque to apanhando. E sei que provavelmente ainda vou apanhar um pouco mais. E agora também dói mais, pois agora sei que entreguei a chibata, as costas e o amor a quem me bateu por tanto tempo. a chibata nem chego a sentir mais. O que dói é saber disso tudo. Que me fiz refém.
Só dói porque eu sei.
E o baque não é do chicote, pois dele fui feito livre. O baque é meu próprio amor, em culpa, me batendo no peito, acelerando meu coração, o próprio coração, me tirando o ar do peito e a força dos braços, como se me baqueasse só para atrair minha atenção, olhar bem nos meus olhos, como só quem ama de verdade olha, e dizendo sem dizer como eu o desapontei. E dizendo sem dizer, Olha quem você foi antes de se fazer refém e olha quem você foi quando feito livre; Olha quem te deu sua liberdade, como só a deu pois lhe prender não era mais prazer; Já caçara outra coisa pra fazer. E dizendo sem dizer, meu próprio amor, agora em perdão, diz, Olha quem você foi ao ser feito livre, mas não livre como morcego fora do inferno, livre como carcaça que de nada mais serve a quem te comeu e olha quem você é, agora não inteiro, mas mais carne do que já foi um dia; Olha como voltou dos mortos livre, e agora livre como se deve ser, livre porque se fez livre, não por ter-se feito livre, livrado, jogado fora; Olha sua vida, olha nos olhos da sua família e percebe que quem te olha como eles olham, como eu te olho, tem por você o verdadeiro amor; Pois o amor vem de várias formas, e nem todas são benéficas, o amor nasce, vive, adoece e morre; O morto não machuca o vivo, e seu amor por quem te bateu morreu; Quem te machuca sou eu, seu próprio amor, em culpa, pois o amor nasce e vive, e quem vive sente, e eu, seu próprio amor sente raiva,
Eu sinto raiva,
sinto raiva por não ter feito nada por ti quando precisavas de mim, por você não ter feito nada por ti quando precisavas; Me transformo em perdão, pois sei que não o fez por mal e que no final das contas tá tudo bem, e fico feliz por você saber disso; Você sabe; Eu só não sou perdão o bastante para que você finalmente possa se perdoar.
Mas somos perdão o suficiente para que eu possa melhorar.
E nisso nos tornamos perdão o bastante para voar. Voei o que pude voar e quando puder eu voo mais. E então pra cá não vou mais voltar.
FALOU!
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Que profundo, amigo. Eu tô impactado com a cruel identificação. Eu, que voo com a asa quebrada há tanto tempo, só posso torcer para que seu vôo te leve longe. Onde essa cena seja só memória e afeto e não mais realidade e materialidade. Abandone a carcaça e transmute-se em nova vida, que é disso que somos feitas, do ciclo.
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